sábado, 11 de agosto de 2007

Noite na cidade

Os passos marcados na calçada, contra e junto ao barulho do vento, quebravam o silêncio da fria noite do mês de maio. Conforme passava pelos prédios, acizentados, azulados escuros, o pensamento divagava, longe, apreensivo, quase perdido.
Todos os estabelecimentos estavam fechados, os bares e pequenos hotéis aparentavam nunca terem logrado existência, até mesmo as prostitutas e travestis tão comuns e integrados à paisagem se faziam ausentes. Olhando para cima notava detalhes da arquitetura que durante o dia não perceberia, construções dos anos 20, 30 escondidas por letras garrafais de fachadas de lojas, anúncios, propagandas de políticos e shows entre umas e outras pixações. Prédios e beirais de telhados com inspirações dos estilo art noveau e gótico, e também caixas bauhausianas, se misturavam com uma estátua suja de um pobre soldado constitucionalista, além de três gárgulas observando do alto de uma loja maçônica. Das vitrines das lojas manequins femininos com roupas de festa de aluguel observavam o passante. Olhava em diante e em perspectiva muito ao longe quase via o final da rua. Uns poucos metros à frente um facho de uma luz amarelada e frágil indicava uma loja que ainda funcionava.
Ao se aproximar observa algo que se parecia com um antiquário, fica curioso e pensa se deve entrar...
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pra começar...

um dos primeiros poemas que li em minha recém saída infância

Sugar e ser sugado pelo amor
no mesmo instante boca milvalente
o corpo dois em um o gozo pleno
que não pertence a mim nem te pertence
um gozo de fusão difusa transfusão
o lamber o chupar e ser chupado
no mesmo espasmo
é tudo boca boca boca boca
sessenta e nove vezes boquilíngua.

Carlos Drummond de Andrade